Pensa em fazer uma pesquisa científica? Pesquisadores de instituições públicas e privadas devem ter atenção redobrada ao coletarem e acessarem o patrimônio genético da biodiversidade brasileira
Juliana Marques
País que abriga um dos maiores patrimônios genéticos mundiais, o Brasil ainda enfrenta entraves para regularizar a coleta de espécies e repartir o acesso ao conhecimento proveniente das pesquisas. Isso tudo por conta da dificuldade que os cientistas encontram ao se adequarem à Medida Provisória 2.186-16 de 2001, que tem como principal objetivo prever a repartição de benefícios com comunidades locais e indígenas (de conhecimento tradicional), além de facilitar o acesso e transferência de tecnologia por parte das instituições.
Por enquanto a lei contempla espécies de animais, vegetais, fungos e bactérias nativos, em habitat natural ou em coleções. Ela exige ainda que seja feita a informação detalhada do lugar da coleta e que as comunidades presentes neste local, detentoras do conhecimento tradicional (como tribos indígenas e quilombolas), autorizem o uso de seres vivos para pesquisas.
Diante destas exigências, pesquisadores da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) contam com o apoio da advogada Rosa Miriam de Vasconcelos, que durante três meses elaborou um material para desmembrar cada artigo da lei. “O objetivo incentivar os cientistas a regulamentarem a pesquisa antes mesmo da coleta de qualquer ser vivo. Se a coleta não estiver autorizada, todo acesso ao patrimônio genético será posteriormente prejudicado”, explicou Vasconcelos em palestra aos pesquisadores da Fiocruz, no complexo de fabricação de medicamentos em Farmanguinhos.
Vasconcelos explica que um dos principais problemas é a coleta de seres vivos nativos, pois muitos dos estudados são exóticos, ou seja, vieram de outros países ainda no período colonial e encontraram aqui boas condições para se multiplicarem. ”As pesquisas feitas mediante a autorização das comunidades também encontram um obstáculo, pois na lei o conceito de comunidade está subjetivo. Até mesmo proprietários de terras podem ser incluídos e em casos de tribos indígenas, por exemplo, é necessário laudo antropológico”, alertou.
Instituições públicas e privadas, bem como seus pesquisadores, que não cumprirem a medida serão advertidos e multados pelo Conselho de Gestão de Patrimônio Genético (CGEN), órgão do Ministério do Ambiente. Além do controle de coleta, acesso e transferência de tecnologia, a Medida Provisória também regulamenta o transporte e a remessa de seres vivos para fins de pesquisa. De acordo com a gravidade da infração, a multa pode alcançar R$ 50 milhões. Por isso, Vasconcelos recomenda aos pesquisadores o registro voluntário ao CGEN, mesmo se não for exigida licença.